olhei direto para o sol. Meu truque antigo: o em volta tão claro que atingia seu oposto e se tornava escuro, enchendo-se de sombras e reflexos que se uniam aos poucos, organizando-se em forma de objetos, ou apenas dançavam, soltos no espaço à minha frente, sem formar coisa alguma. Eram esses que me interessavam, os que dançavam vadios no ar, sem fazer parte das nuvens, das árvores nem das casas. Eu não sabia para onde iam, depois que meu olho novamente acostumado à luz colocava cada coisa em seu lugar, assim: casa - paredes, janelas e portas; árvores - tronco, galhos e folhas; nuvem - fiapos estirados ou embolados, vezenquando brancos, vezenquando coloridos. Cada coisa, cada coisa: inteira, na união de todas as suas infinitas partes. Mas e a sombra e os reflexos, esses que não se integravam em forma algua, onde ficavam guardados? Para onde ia a parte das coisas que não cabia na própria coisa? Para o fundo do meu olho, esperando o ofuscamento para vir outra vez à tona? Ou entre as próprias coisas-coisas, no espaço vazio entre o fim de uma parte e o começo de outra? Como um por trás do real, feito espírito de sombra ou luz, claro-escuro escondido no mais de-dentro de um tronco ou no pequeno espaço entre um tijolo e outro ou no meio de dois fiapos de nuvem - onde?
Caio Fernando Abreu
Alina Baraz Galimatias - Make You Feel
Alina Baraz Galimatias - Make You Feel
Nenhum comentário:
Postar um comentário